Negatória de Paternidade: como fica a situação do filho??
O reconhecimento voluntário de paternidade, com ou sem dúvida por parte de quem reconhece, é irrevogável e irretratável, somente podendo ser desconstituído mediante prova de que se deu por erro, dolo ou coação; vícios estes aptos a nulificar os atos jurídicos em geral. É o que dispõem os artigos 1.609 e 1.610, do Código Civil, vejamos:
Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:
I – no registro do nascimento;
II – por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;
III – por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;
IV – por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.
Art. 1.610. O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito em testamento.
Entretanto, em que pese haja a possibilidade de o resultado da perícia genética ser no sentido desfavorável ao efetivo reconhecimento da filiação, em eventual ação judicial com o presente objeto, é medida de cautela a manutenção da verba alimentar do filho, até que seja apurada a existência ou não, do vínculo socioafetivo.
Assim, conforme se depreende da análise de inúmeros julgados jurisprudenciais, embora aquele que pleiteia a procedência da ação negatória de paternidade não seja, de fato, o pai biológico da criança ou adolescente envolvido, como se busca a confirmação através do exame biológico, se faz necessária a comprovação de elementos capazes de demonstrar a ocorrência de vício de consentimento – coação, erro, dolo, simulação ou fraude – na realização do ato jurídico de declaração de paternidade no registro de nascimento da criança, não podendo haver, por outro lado, evidências de vínculo socioafetivo entre ambos, conforme estudo social a ser realizado em cada caso concreto.
Dessa maneira, a ação negatória de paternidade é aquela ajuizada por quem teve o vínculo gerado pela presunção matrimonial ou convivencial de filiação, nos casos de casais casados ou vivendo em união estável, nos moldes da previsão do artigo 1.597 do Código Civil, com a pretensão real de afastá-la. Nesses casos, o marido ou companheiro tem a CERTEZA que era pai biológico, já que em união com a mãe do suposto filho, é desse fato que surge a presunção de paternidade.
O que deve ficar claro é que apenas haverá a possibilidade de procedência da ação negatória, com a declaração da extinção do vínculo de filiação e da paternidade, com seus devidos reflexos, nos casos em que devidamente comprovada a presença de algum dos vícios de consentimento, necessitando, ainda, inexistir vínculo socioafetivo entre pai e filho, assim declarados.
Isso porque a criança não pode ser prejudicada afetivamente, em seu mais profundo âmago sentimental, por desenlaces amorosos entre adultos irresponsáveis. Ora, se por longos anos houve reconhecimento de certa filiação, através de uma paternidade presumida, com a criação de laços afetivos entre os envolvidos, não é justo que de um dia para o outro tudo mude e não sejam garantidos os direitos fundamentais dos pequenos, os quais são os mais vulneráveis nessas relações familiares em conflito.
Percebam que a ação negatória de paternidade difere da ação de investigação de paternidade, uma vez que na primeira se busca extinguir o vínculo já reconhecido e na segunda se busca o reconhecimento do mesmo.
Veja também:
Investigação de Paternidade: Lei nº 14.138/2021 – post mortem
Advogada, graduada pela Unisinos; inscrita na OAB/RS 71.434; Especialista nas áreas de Direito Civil, com ênfase em Família e Sucessões, e Imobiliário; Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM/RS; Integrante da Comissão de Infância e Juventude do IBDFAM/RS.