Lei Maria da Penha – 11.340/2006: das diversas formas de violência
O tema em testilha é um tanto inquietante e, ao tratarmos de violência contra a mulher, logo lembramos da Lei Maria da Penha, a qual entrou em vigor em 22 de setembro de 2006.
A referida lei é destinada a proteger a mulher e a entidade familiar contra a violência doméstica, deixando de inserir no seu âmbito de proteção tão somente a mulher por conduta baseada no gênero.
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Assim, a Lei Maria da Penha não se aplica às vítimas do sexo masculino. Entretanto, aplica-se tal diploma legal igualmente nas relações homoafetivas, desde de que a vítima seja lésbica, travesti ou transexual.
Isso porque a violência doméstica também é reconhecida nessas relações formadas por pessoas do mesmo sexo, face ao que dispõe o artigo 2°, que assim menciona: “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual (…) goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana.”
O que se percebe é que a intenção do legislador foi clara em proteger a mulher, que se encontra em situação de risco, porque entende que essa merece uma proteção especial, já que – na maioria dos casos – existe uma situação de desigualdade em relação ao homem, seja do ponto de vista físico, seja do ponto de vista das relações domésticas, familiares e até sociais.
Decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 7 de agosto de 2006, a lei entrou em vigor no dia 22 de setembro de 2006. Wikipédia
A Lei Maria da Penha, então, se aplica à grande massa de mulheres que sofrem agressões e que não contavam, até 2006, com mecanismos jurídicos adequados para garantir os seus direitos, no que toca a proteção quanto à toda forma de violência de gênero ou nas relações onde exista afeto, que possam causar a morte; lesão; sofrimento físico, sexual, psicológico; dano moral ou patrimonial; no seio da unidade doméstica ou familiar.
Para os efeitos da Lei, será considerada violência doméstica aquela que ocorra no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou em qualquer relação íntima de afeto, independentemente da orientação sexual da vítima.
Vale lembrar, que entende-se por família aquele conjunto de pessoas que são aparentadas ou se consideram aparentadas, unidas por laços de sangue (exemplos: pai e filha; irmão e irmã; tio e sobrinha, etc.), de afinidade (exemplos: cunhado e cunhada; padrasto e enteada, sogro e nora, sogra e nora, etc.) ou por vontade expressa (exemplos: pai e filha por adoção).
No caso das relações íntimas de afeto, a violência recebe espaço quando o agressor convive ou tenha convivido com a vítima, ainda que não morem sob o mesmo teto (exemplo: namorado e namorada).
Em suma, a violência – para ser considerada como doméstica – não exige a diferença de sexos entre seus atores. Agressores de ambos os sexos se sujeitam aos efeitos da lei; o que quer dizer que o sujeito ativo (agressor) pode ser um homem ou uma mulher.
O melhor exemplo é o caso de violência doméstica entre lésbicas, que possuem relação afetiva. Ou seja, a agressora, em que pese seja mulher, possui orientação sexual diversa da heterossexualidade.
Já quando examinamos a violência no âmbito da família, percebemos que a vítima poderá ser até mesmo uma criança, desde que o fato não esteja enquadrado nas disposições trazidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (artigo 148).
Sabendo, com isso, quem são os partícipes dessa relação de violência, se faz necessário ter conhecimento – igualmente – sobre as FORMAS DE VIOLÊNCIA que a lei possui abrangência. Tais agressões domésticas, denominadas então como VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, são classificadas da seguinte maneira, vejamos:
- Violência Física: quando, por vezes, deixa marcas e sequelas físicas (não sendo tais fatores exigíveis para instauração do expediente), podendo – inclusive – agredir a saúde corporal da vítima, que corresponde ao estresse crônico, pós-traumático. Importante ressaltar que o SUS é obrigado a realizar cirurgia plástica reparadora nos casos em que a vítima apresentar o boletim de ocorrência à unidade de saúde;
- Violência psicológica: trata-se de proteção à auto-estima e à saúde psicológica da vítima nos casos em que ocorrem agressões emocionais. Nesta classificação as estratégias do agressor se perfazem com a submissão pelo medo, desqualificação da imagem e pelo bloqueio das formas de sair, no tocante ao direito de ir e vir da vítima. Aqui se diagnostica a tão conhecida “dor na alma”, perpetrada por ações constantes do agressor, que – na maioria dos casos – perdura por longos anos;
- Violência sexual: tipificada quando o agressor obriga (física ou psicologicamente) a vítima a ter relação sexual não desejada; e nesta modalidade se enquadram os crimes de estupro (artigo 213, Código Penal), violação sexual mediante fraude (artigo 215, Código Penal), assédio sexual (artigo 216-A, Código Penal), crime sexual contra vulneráveis (artigo 217-A, Código Penal) e satisfação de lascívia (artigo 218-A, Código Penal), desde que todos eles sejam praticados contra mulher e no âmbito das relações domésticas, familiares ou de simples afeto;
- Violência patrimonial: subtração/destruição/retenção de bem com a finalidade de causar dor ou dissabor à vítima. Frise-se que no caso de devedor de alimentos, deixando este de cumprir com sua obrigação, quando dispõe de condição econômica para tanto, tal omissão também pode ser tipificada como abandono material em face da alimentada;
- Violência moral: esta forma de violência se caracteriza pela desqualificação da vítima no meio social, de modo a atingir a autoestima da mulher, objetivando a sua inferiorização e/ou ridicularização.
Nesse contexto, vale lembrar que mesmo inexistindo elementos probatórios para a concessão da medida protetiva, basta a palavra da vítima, já que esta possui presunção de veracidade (ao menos inicialmente); ocorrendo – de pronto – a inversão do ônus da prova.
Contudo, esse processo passará pelo devido processo legal, onde o acusado terá condições de ofertar sua defesa na forma da lei e demonstrar sua inocência, quando for o caso.
Face à essas questões, o legislador estabeleceu dois tipos de medidas de proteção; isto é, há medidas de proteção que obrigam o agressor e medidas de proteção em relação à vítima.
Lei Maria da Penha: Medidas protetivas de urgência, que obrigam o agressor
As medidas protetivas de urgência, que obrigam o agressor, estão previstas no artigo 22 da Lei Maria da penha, sendo elas:
a) suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente;
b) afastamento do lar, domicílio ou local de conveniência com a vítima;
c) proibição de determinadas condutas, como aproximação da vítima, de seus familiares e das testemunhas, devendo o juiz fixar o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
d) proibição de contato com a vítima, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
e) proibição de que o agressor frequente determinados lugares, a fim de preservar a integridade física e psicológica da vítima;
f) restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores (filhos); e
g) prestação de alimentos provisionais ou provisórios à mulher e aos filhos.
Medidas protetivas de urgência destinadas à vítima
As medidas protetivas de urgência destinadas à vítima estão relacionadas nos artigos 23 e 24, da mesma Lei, sendo elas:
a) encaminhamento da vítima e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
b) recondução da vítima e de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
c) afastamento da vítima do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
d) separação de corpos;
e) restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à vítima;
f) proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização do juiz;
g) suspensão das procurações conferidas pela vítima ao agressor; e
h) prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a vítima.
Vale lembrar, por oportuno, que apesar da lei Maria da Penha não se tratar de uma lei penal, mas sim de cunho civil, os processos tramitam e são julgados pelos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – JVDFMs.
Entretanto, nos locais onde não estiver instalado o JVDFM, o procedimento será encaminhado à Vara Criminal local.
Diante do exposto, se percebe que a Lei Maria da Penha veio a calhar, para garantir maior e melhor assistência às mulheres, vítimas de violência doméstica, a qual assumiu maior amplitude, resguardando também os direitos das mulheres em situação de violência familiar e afetiva.
Esperamos que a população de nosso país possa, em curto espaço de tempo, se conscientizar sobre o presente tema e demonstrar, através de melhores atitudes, que a paz e o amor nestas relações ainda são possíveis em nossa sociedade em tempos tão cruéis.
Advogada, graduada pela Unisinos; inscrita na OAB/RS 71.434; Especialista nas áreas de Direito Civil, com ênfase em Família e Sucessões, e Imobiliário; Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM/RS; Integrante da Comissão de Infância e Juventude do IBDFAM/RS.